segunda-feira, 2 de abril de 2012

Um conto Chinês (Un Cuento Chino)

2011 / Argentina/Espanha / 93 min
"Um argentino e um chinês, unidos por uma vaca que caiu do céu". Isso pode soar absurdamente estranho, contudo, esse grande filme é, acredite, baseado em fatos reais.

O sistemático cinquentão Roberto (Ricardo Darín) leva uma vida solitária e extremamente metódica, administrando com zelo sua calma loja de ferragens. É tão recluso que ignora constantemente as insinuações da bela Mari (Muriel Santa Ana), a mulher com quem teve um breve romance. Sua rotina, contudo, vira de pernas para o ar (quase literalmente, na criativa cena no início do filme) quando o maroto destino lhe apresenta o jovem chinês Jun (Ignacio Huang), um imigrante ilegal que não fala uma sequer palavra de espanhol. Embora misantropo e neurótico, Roberto possui um bom coração que o impede de abandonar o desamparado rapaz que apenas quer encontrar seu ansiado tio.

A convivência com o chinês desperta em Roberto um conflito de sentimentos e memórias que remetem a seu passado, na guerra das Malvinas. Aos poucos e, mesmo sem se dar conta, seus paradigmas vão sendo quebrados (literalmente, em alguns casos) e as cicatrizes, amenizadas. Mais do que travessura do destino e alusão ao recomeço, fica evidente que entender uma pessoa vai muito além de falar o mesmo idioma e que compreender a si mesmo é a mais difícil tarefa.


A premissa que levou o diretor Sebastián Borensztein a escrever o script, segundo ele próprio,  foi: "Quanto mais longe escapar de si mesmo, mas perto estarás de ti. Quanto mais reprimir-se dentro de si, maior será o golpe que lhe fará sair".
O roteiro é semelhante a Melhor é ImpossívelNinguém é Perfeito e o recente Um Parto de Viagem; contudo, o filme triunfa!

Darín, cuja minha admiração só aumenta desde O Segredo de Seus Olhos, é brilhante. Seu mal humorado personagem é apresentado contando os parafusos de uma nova caixa que supostamente deveria conter 350 unidades e, pela tolerância produtiva, continha um pouco menos. E assim começam os xingamentos; sinceros "Puta madre que me parió!" são abundantes, em momentos hilários de sua excelente atuação.

O chinês Ignacio Huang é um show à parte. Não se entende nada do que ele fala (a não ser que você fale chinês) e não há legendas. Mesmo assim ele consegue expressar suas emoções de forma singular. Prepare-se para rir e chorar... E para chorar de rir!

Com poucos recursos, esse pequeno-grande filme é a prova que os nós brasileiros estamos muito atrás dos argentinos em matéria de roteiro. Simples e cativante, Um Conto Chinês consegue ser uma comédia dramática de alta qualidade que consegue passar uma bela mensagem de maneira sutil e natural, sem pressa e sem estereótipos americanos.
E o que tem a vaca com isso? Bem, esse curioso detalhe cabe a você, digno leitor, descobrir e traduzir.

Curiosidades:

Em espanhol, "un cuento chino", é uma expressão equivalente à brasileira "história de pescador", ou - e ainda mais coerente com o filme (e ao curioso cartaz), "história pra boi dormir".

Após os créditos, surge a reportagem russa verídica da vaca que caiu do céu atingindo um barco pesqueiro.

Frase:

La vida es un gran sin sentido, un absurdo.

Nota 8

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